segunda-feira, 14 de maio de 2012

Objectivos de Desenvolvimento do Milénio e Segurança Humana

Os países membros da ONU decidiram, em 2000, assumir oito Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM), onde direitos humanos, igualdade, desenvolvimento e cooperação são palavras-chave. Seis dos oito objectivos traçados reportam directamente à melhoria das condições de vida, sobretudo dos mais desfavorecidos, visando erradicar a pobreza extrema e a fome, atingir o ensino primário universal, promover a igualdade de género, reduzir a mortalidade infantil, melhorar a saúde materna e combater o VIH/Sida, a malária e outras doenças graves. Os dois objectivos restantes visam garantir a sustentabilidade ambiental e a criação de uma parceria global para o desenvolvimento.

É impossível desligar o conceito de ODM da globalização e da ideia de segurança humana, que passa não só por criar sistemas políticos, sociais, económicos, entre outros, que garantam o respeito dos direitos humanos, mas também por fornecer às populações instrumentos para que elas aprendam o usar os seus recursos para se defenderem. Ou seja, quando se fala em segurança humana, não é tanto o Estado que está em causa, mas antes o indivíduo. Assim, ameaças como actos de terrorismo são uma questão sobretudo de segurança humana, já que afectam o bem-estar da população e põem em causa a estabilidade político-social de um país ou região.

“Não é possível combater a pobreza e a fome se as populações não estiverem em segurança, e não há segurança se as populações passarem fome”, denota o Instituto de Estudos Estratégicos e Internacionais (IEEI), que reconhece uma nova forma de pensar a segurança das populações no século XXI.

Destaque também para o facto de tanto os ODM como a segurança humana apostarem no envolvimento de novos actores, para além do Estado, como por exemplo associações, organizações e indivíduos, dependendo da cooperação.

Desafios aos ODM e à segurança humana

No relatório de 2010 sobre o cumprimento dos ODM, a ONU destaca que a crise económica afectou os empregos e os rendimentos em todo o mundo, mas não afectou a consecução da meta dos ODM, que consiste em reduzir a taxa de pobreza extrema para metade até 2015. O relatório realça uma série de êxitos, para além de avaliar o impacto humano da ausência de progressos suficientes no que respeita a muitos dos objectivos. "Ao mesmo tempo, é manifesto que as melhorias na vida dos pobres têm sido inaceitavelmente lentas e que alguns avanços duramente conquistados estão a ser erodidos pelas crises climática, alimentar e económica”, escreve Ban Ki-moon no preâmbulo do relatório. O documento refere avanços significativos na escolarização de crianças no ensino primário, em muitos países pobres, especialmente em África, bem como intervenções vigorosas nos domínios da luta contra a Sida e a malária e na saúde infantil. O documento afirma ainda que há uma boa probabilidade de se atingir a meta do acesso à água potável. Porém, as desvantagens que afectam os pobres e as pessoas que vivem em zonas remotas, que têm deficiência ou que são discriminadas devido à sua etnia ou sexo têm dificultado o avanço em muitas outras frentes (Fontes, 2010).

"A cinco anos do fim, é completamente inaceitável que os líderes mundiais ainda não tenham chegado a acordo no sentido de tomarem acções concretas para acabar com a discriminação e outras violações aos direitos humanos que impedem os ODM de beneficiarem aqueles que mais precisam deles", disse Salil Shetty, secretário-geral da Amnistia Internacional (Expresso, 2010). A organização criticou o facto de o discurso dos líderes muitas vezes não se traduzir em acções e defendeu que os líderes deviam criar instrumentos para responsabilizar os incumpridores dos ODM.

“Globalmente, foram conseguidos progressos na concretização da educação primária universal. Contudo, doadores e Estados devem agora fazer um enfoque na educação das crianças que vivem em estados afectados por conflitos e frágeis” afirmou, por seu lado, Jasmine Whitbread, Directora Executiva de Save the Children. “Trata-se de um enorme desperdício de potencial cuja continuação não podemos permitir”, acrescentou (UNICEF, 2010).

Segundo um estudo publicado pelo Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo (CIP-CI), mais da metade das nações só aumentou o ritmo das melhorias em poucos indicadores: “pagamento da dívida como percentagem das exportações, parcela da população a viver em favelas, mulheres eleitas para o parlamento nacional, proporção da população a viver com menos de um dólar por dia e percentagem da população empregada” (PrimaPagina, 2010). A análise releva ainda que muitos países regrediram em vários indicadores. “Ao mesmo tempo, a análise mostra que as nações mais pobres são as que estão a desenvolver-se mais rapidamente” (ibidem).

Efectivamente, as críticas ao progresso feito no âmbito dos ODM fazem-se ouvir, sobretudo nos objectivos que mais mexem com a segurança humana, ainda que os líderes estejam convencidos de que as metas vão ser cumpridas no prazo previsto.

Ao analisar o que tem sido feito pelos ODM, é preciso ter em conta realidades novas, como a crise económico-financeira que começou em 2008 e cujos efeitos ainda se fazem sentir levando alguns países desenvolvidos a terem de ajudar outros com um nível semelhante de desenvolvimento, em detrimento de investirem nos países mais pobres. Depois de África ter atingido entre 2000 e 2008 um crescimento económico, em média, superior a cinco por cento por ano, a evolução em 2009 não chegou aos dois por cento.

Outro exemplo é a luta contra o terrorismo, que ganhou uma grande fatia do orçamento de vários países a partir de 2001. O Reino Unido, um dos maiores doadores de ajuda ao desenvolvimento de todo o mundo, teve de direccionar ajudas previstas para combater a pobreza para a luta contra o terrorismo, sobretudo para a guerra no Iraque. As prioridades de desenvolvimento que saíram da Cimeira do Milénio “vêem-se hoje relegadas para as prioridades concedidas à segurança no seu sentido mais clássico”, ligado ao rearmamento (Portolés, 2007, p. 6).

Um problema que prejudica em larga medida a construção do mundo que a ONU desenhou em 2000 está relacionado com a realidade dos estados falhados. Se indicadores económicos menos favoráveis podem ser contornados através da ajuda externa, a verdade é que problemas como a intervenção de estados externos, falta de autoridade do governo para tomar decisões aceites pela população ou territórios com um imenso movimento de refugiados são bem mais difíceis de envolver no cumprimento dos ODM.

Apesar das dúvidas sobre se os ODM serão efectivamente cumpridos nas datas previstas, a verdade é que caminham para melhorar a segurança humana. Devido à globalização, cada vez mais pessoas têm consciência de que “nenhum homem é uma ilha”, como disse John Donne. “A consciência dos riscos e das ameaças à segurança humana é, pois, o primeiro passo para esconjurar fantasmas e prevenir rupturas sérias nas nossas próprias sociedades”, reforçou António Vitorino (Vitorino, 2006). Além disso, como disse António Martins, “um problema é sempre uma oportunidade, para os que acreditam no direito das sociedades a construir o seu futuro comum” (Martins, 2006, p. 79).

Referências bibliográficas:

- Instituto de Estudos Estratégicos e Internacionais (IEEI), “Segurança Humana”, in http://www.google.pt/url?sa=t&source=web&cd=3&ved=0CCQQFjAC&url=http%3A%2F%2Fwww.atua.com.pt%2Foutput_efile.aspx%3Fsid%3D810b1da4-4ca8-4c69-a585-a017e3387917%26cntx%3DFrbm7%252FyYG0nXD%252BDFQUwtDauPrJ8kIVa2QIBNiU3Ze0d5sbE%252BL3dSy4LzSUqEO56YSdIWMXnGiZYYYIK5x5gDbQ%253D%253D%26idf%3D888&ei=6YS4Tc7FHoKnhAfuooCKDw&usg=AFQjCNGhk2CNUO4_aFaOsi_nC4wWvfEeZw&sig2=iT5i9afpM93SmE3Ab66xAw (Consultado em Abril de 2011)

- Expresso (2010), “Cimeira dos ODM: Os líderes mundiais falharam a defesa dos direitos dos mais pobres”, in http://aeiou.expresso.pt/gen.pl?p=stories&op=view&fokey=ex.stories/605311 (Consultado em Abril de 2011)

- FONTES, Ilda (2010), “ONU: Relatório anual sobre os ODM com resultados heterogéneos”, in http://www.expressodasilhas.sapo.cv/pt/noticias/detail/id/17970 (Consultado em Abril de 2011)

- MARTINS, António (2006), “O compromisso das empresas com as metas do milénio – Volume II”, São Paulo, Instituto Ethos

- PORTOLÉS, Carmen Magallón (2007), “Segurança humana e luta anti-terrorista. O impacto no desenvolvimento”, in http://www.google.pt/url?sa=t&source=web&cd=1&ved=0CBsQFjAA&url=http%3A%2F%2Fwww.hegoa.ehu.es%2Fcongreso%2Fbilbo%2Fdoku%2Fbost%2Fseguridad_luchaantiterrorista.pdf&ei=6UC8TYakJoKHhQet-ZG6BQ&usg=AFQjCNGYileKO2gT0Sh3ft2r6aadG9Rlkw&sig2=ci1mi7FEtq1Di9UAyHLlEg (Consultado em Abril de 2011)

- PrimaPagina (2010), “Maioria dos países não acelerou nos ODM”, in http://www.pnud.org.br/odm/reportagens/index.php?id01=3592&lay=odm (Consultado em Abril de 2011)

- UNICEF (2010), “UNICEF realça o papel fundamental da educação no desenvolvimento”, in http://www.educacaoparatodos.org/index.php?option=com_content&view=article&id=46:unicef-realca-o-papel-fundamental-da-educacao-no-desenvolvimento (Consultado em Abril de 2011)

- VITORINO, António (2006), “Segurança humana”, in http://www.dn.pt/inicio/interior.aspx?content_id=637164&page=2 (Consultado em Abril de 2011)

Nota: Trabalho realizado em Abril de 2011.

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