segunda-feira, 4 de junho de 2012

Fundamentalismo ecológico

No âmbito do trabalho académico sobre fundamentalismos enquanto problemas sociais, e depois de ter falado de fundamentalismo religioso, fundamentalismo étnico e fundamentalismo de mercado, cabe-me finalmente abordar o fundamentalismo ecológico. Obrigada por me terem acompanhado.

Muitos fundamentalismos partem de posturas positivas. Não só é positivo para os homens serem religiosos, como também o é defenderem o ambiente. O problema surge quando essas crenças se tornam demasiado fechadas, uma questão que é tão mais evidente quando se fala sobre um tema baseado numa realidade mutante, mais do que em escritos antigos. É o que acontece com o fundamentalismo ecológico, que acaba por prejudicar as causas que defende.

Jennifer Marohasy alerta que “as políticas públicas de ambiente estão a ser conduzidas mais por crenças determinadas do que pela ciência” e apela a uma abertura mental perante evidências (Marohasy, 2004, p. 41). Ao falar de fundamentalismo, este ambientalista dá o exemplo dos governos que baniram as colheitas de organismos geneticamente modificados, lembrando que esta alimentação é considerada de qualidade e segura. “Respeito os direitos daqueles que não querem comer alimentos geneticamente modificados, da mesma forma que respeito os direitos dos muçulmanos de não comerem carne de porco, mas as campanhas contra os alimentos geneticamente modificados não parecem aceitar o meu direito de escolha”, realça, frisando que este tipo de organismos têm benefícios, como a redução do uso de pesticidas e a potencialidade de alimentar uma população mundial cada vez maior (Marohasy, 2004, p. 45).

Kátia Abreu também se mostra defensora do “conhecimento científico” aplicado ao ambiente em substituição daquilo a que chama de 'fanatismo', algo que leva uns poucos que se autodenominam 'defensores da natureza' a “definir o bem e o mal e lançar sentenças arbitrárias”. “O que decidem passa em julgado, sem apelação” e a “sociedade, perplexa e generosa, preocupada com a qualidade de vida, as mudanças climáticas e a própria sobrevivência do planeta, submete-se a toda sorte de exageros”, critica. A mesma autora aponta ainda o dedo a leis ambientais que “revelam generosidade e ignorância, pois, na sua maioria, não têm nenhuma base científica e experimental”. (Abreu, 2010).

Este activismo exagerado alimenta-se do medo das pessoas da mesma forma que o fazem os fundamentalistas religiosos, sendo que enquanto os primeiros jogam com o temor de uma vida sem palco ou mesmo de uma morte provocada por questões ambientais, os segundos servem-se do medo de uma vida tenebrosa depois da morte.

Thomas Gale Moore reforça esta ideia ao defender que os ecologistas zelosos substituíram uma fé em Deus por uma adoração do ambiente. Este fanatismo, combinado com histeria, uma ciência questionável e grupos especiais de interesse está a comandar políticas governamentais sem consideração pelos incentivos de mercado, riscos, ou custos, defende. Um exemplo disso são as medidas de controlo de poluição mal projectadas que impuseram custos demasiado elevados e em grande parte desnecessários, exemplifica o mesmo autor (Moore, 1992).

No mesmo sentido, falando da realidade brasileira, Kátia Abreu considera que os paradigmas que querem impor ao país reflectem “o remorso, a hipocrisia e, principalmente, o poder económico dos povos até agora ditos desenvolvidos e que através de milénios de História desobstruíram as suas paisagens e não têm mais condições de recompô-las” (Abreu, 2010).

Efectivamente ao representar, em muitos casos, um entrave à industrialização, o fundamentalismo ambiental constitui um problema social, já que pode gerar falta de produtos, danos económicos e desemprego. Neste âmbito, o Estado assume aqui um papel importante, no sentido de identificar o fundamentalismo e distingui-lo de posições em defesa do ambiente mais moderadas e assentes em estudos científicos.

Além disso, António de Almeida Santos alerta que “é a visão fundamentalista da problemática ecológica que exalta a harmonia natural contra a agressão das civilizações” (Santos, 1998, p. 59).

Importa ressalvar que os meios de comunicação social, como agente de socialização, jogam um papel importantíssimo na definição das opiniões públicas e, logo, no que a população exige dos governos. Numa lógica de mercado, muitos meios de comunicação social optam por 'vender' posições alarmistas, descurando a sua responsabilidade. Pablo Ariel Pellegrini dá o exemplo das controvérsias ambientais sobre a relação entre furacões e aquecimento global, uma questão pouco consensual no meio cientifico, para dizer que um artigo publicado na revista Philosophical Transactions of the Royal Society of London em Julho de 1997, no qual “cientistas asseguravam que o aquecimento global tinha um enorme impacto na formação de furacões”, foi citado pelos meios de comunicação “umas 79 vezes”, enquanto um artigo publicado em Dezembro do mesmo ano na revista Nature, onde era sugerida uma posição contrária, foi citado nos grandes meios de informação “sete vezes” (Pellegrini, p. 13 e 14). Além disso, nota-se que mais do que cientistas ou governantes, os meios de comunicação social ouvem sobretudo activistas quando se fala de ambiente, até pela dependência destes em relação aos 'media' para disseminarem as suas ideias.

Referências bibliográficas:

ABREU, Kátia (2010), “Verdade ambientalista versus fundamentalismo”, in http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100322/not_imp527458,0.php (Consultado em Janeiro de 2011).

MAROHASY, Jennifer (2004), “Environmental Fundamentalism”, in Policy, Vol. 20, nr. 3.

MOORE, Thomas Gale (1992), Environmental fundamentalism, California, Hoover Institution on War, Revolution, and Peace, Stanford University.

PELLEGRINI, Pablo Ariel, “Trangénicos e indústria do papel: quando o discurso científico perde autoridade. O papel da ciência nas controversias ambientais”, Argentina, Instituto de Estudos sobre a Ciência e a Tecnologia da Universidade Nacional de Quilmes.

SANTOS, António de Almeida (1998), Por favor, preocupem-se!, Lisboa, Editorial Notícias.

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