quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Irmandade Muçulmana


Numa altura em que é dado como certo que a Irmandade Muçulmana seja a grande vencedora das eleições a ocorrer no Egipto, impera clarificar alguns pontos sobre a organização.

Irmandade Muçulmana

A Irmandade Muçulmana (jamiat al-Ikhwan al-muslimun) Sociedade de Irmãos Muçulmanos é uma organização fundamentalista islâmica, fundada em 1928 no Egipto, por Hassan al Banna. Pretendia unir as nações islâmicas sob um único califado, de acordo com o sunismo. Da doutrina da organização saliento a rejeição ao colonialismo e aos valores ocidentais, retorno à pureza do Islão, recurso à Jihad, unificação da Umma sob um califado unificado, abolição de todas as instituições implementadas pelos ocidentais no mundo muçulmano e ainda eliminação de Israel.

Na opinião de al Banna o Islão teria perdido o domínio sob a sociedade, uma vez que muitos muçulmanos se haviam corrompido por ideais ocidentais. A Shari´a, lei islâmica, seria então a solução para tal problemática e deveria ser aplicada a todos os níveis da vida humana e da sociedade, como demonstra o lema da própria organização, «Alá é o nosso objectivo. O Profeta o nosso líder. O Alcorão a nossa lei. Jihad é o nosso caminho. Morrer pelo caminho de Alá é a nossa maior esperança».

Rapidamente a organização tornou-se numa força política com relativa expressão no Egipto. À altura a organização pretendia libertar a região dos estrangeiros e infiéis, estabelecendo então um Estado islâmico unificado.

Se inicialmente a Irmandade Muçulmana detinha um carácter espiritual ou religioso, a partir de sensivelmente de 1938 torna-se num movimento político.

Hassan al-Banna cria então uma organização paramilitar, inspirado nos “camisas negras” de Mussolini, cujo lema era “acção, obediência, silencio, fé e luta”. De carácter secreto dispunha de uma agência de inteligência com intuito de coordenar ataques terroristas e/ou assassinatos. Paralelamente construiu fábricas, escolas e hospitais, conseguiu ainda infiltrar-se em sindicatos e nas forças armadas. Consequentemente nos finais da década de 40 do século XX, a Irmandade Muçulmana era considerado um “Estado dentro do Estado”, visto que a organização acercava todos os sectores da sociedade.

Até então a organização não tinha enfrentado nem a Coroa nem os ingleses que detinham imensos interesses na região. Convém salientar que o Egipto tornou-se independente a 22 de Fevereiro de 1922, mas ainda assim o Reino Unido mantinha as suas tropas no canal do Suez, com a assinatura do tratado anglo-egípcio em 1936. Só nos finais dos anos 40, após deter uma capacidade orgânica e militar, a Irmandade Muçulmana encetou ataques terroristas contra os interesses judeus e ingleses no território.

A tensão entre a organização e o governo aumentaria. A tentativa frustrada de um golpe de estado contra a monarquia e o desmantelamento do mesmo pelo Primeiro-Ministro Nuqrashi do Rei Farouk, culminou no assassinato daquele em 1949, e posteriormente como retaliação na morte de Hassan al-Banna e de outros membros da organização. Apesar da morte do líder, aquela continuou a actividade que vinha desempenhando desde os anos 20. Hassan al Hudaibi tornar-se-ia o Guia da Irmandade.

No Egipto, um golpe militar acabava com a monarquia, estabelecendo o regime militar a 23 de Julho de 1952. Impera salientar que no decorrer da mudança de regime, a Irmandade Muçulmana apoiou o “Movimento dos Oficiais Livres” liderados por Gamal Abdel Nasser, Mohamed Naguid e Anuar El Sadat. Em 1954 a Irmandade Muçulmana era dissolvida pelas autoridades, mas a sua actividade continuava, mantendo-se como oposição ao governo.

Após Nasser, al-Sadat e Mubarak usaram a Irmandade como forma de diminuir a força da extrema-esquerda. A organização era aceite como grupo religioso mas sucumbia-se a um extremo controlo do governo.

É nos anos 90 que a Irmandade Muçulmana, a partir de três manifestos publicados, “Democracia Indispensável”, “Nossos Irmãos e Compatriotas Coptas” e ainda “Estatuto da Mulher”, se apresenta como um movimento democrático no Egipto, ainda assim não cessa o seu apoio a grupos Jihadistas, como o Hamas e a Jihad Islâmica.

Por diversas vezes a Irmandade Muçulmana foi impedida de concorrer às eleições como partido político, daí que os seus membros tenham candidatado como independentes ou então associados a outros partidos. Como é mencionado em a Importância Do Islamismo Político No Médio Oriente”, «(…) a Irmandade é tolerada até um certo nível, oficialmente é ilegal, não tem autorização para distribuir literatura ou para se reunir publicamente, e os seus membros são objecto de prisões periódicas. Todavia, a Irmandade é responsável pela publicação de dois jornais – Liwa' al-islam ("The Banner of Islam") e al-I'tisam, ("Adherence") –, mantém escritórios regionais e nacionais, faz declarações públicas e livros da autoria de “Irmãos” proeminentes são vendidos em livrarias». (Leal.2006:240)

Dada a sua dimensão, a Irmandade Muçulmana em termos estruturais é um movimento político-religioso, visto a acção política que encabeça e o estrito respeito pela Lei Islâmica. A organização deve obediência e fidelidade ao Guia Supremo, Mushid. É o Conselho Consultivo Geral, majlis al shura, que escolhe o Guia Supremo. Este é auxiliado por um Gabinete de Orientação, maktab ai irshad al´amm, e ainda por nove Comités Especializados.

Hassan al-Banna quando criou a organização «(…) insistiu na necessidade de assegurar a justiça social, cuja responsabilidade cabia ao Estado através da aplicação do imposto islâmico (zakat) e da sua redistribuição. (…) Propôs a reorganização da sociedade a partir de um Estado Islâmico. Relativamente aos castigos ordenados pelo Alcorão (os hudud), o fundador defendeu que estes não podiam ser aplicados numa sociedade verdadeiramente islâmica onde regenera a justiça. No plano internacional, H. al-Banna críticou o nacionalismo e sonhou com a reconstrução da Umma». (Idem.219).

Como referido trata-se de um movimento internacionalizado, desde logo expandiu-se além fronteiras egípcias. Em 1944 era criada na Síria a Irmandade Muçulmana; em 1946 era criada uma secção na Jordânia; em 1954 era a vez do Sudão; em 1946 era estabelecida na Palestina a Irmandade Muçulmana; posteriormente era a vez de Marrocos, Tunísia e Argélia, por volta da década de 70. No restante mundo islâmico, a organização expandiu-se sucessivamente até meados dos anos 90.

Impera salientar que a Irmandade Muçulmana foi o embrião para determinados grupos terroristas islâmicos, como o Hamas, Hezbollah, Jihad Islâmica, Al Qaeda e outros.

Bibliografia:

v LEAL, Catarina Mendes. (2006) “A Importância do Islamismo Político no Médio Oriente”, in http://www.dpp.pt/Lists/Pesquisa%20Avanada/Attachments/1366/infor_inter_2006_supl_V.pdf;

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