quarta-feira, 14 de março de 2012

A mediatização de um homem, Kony

A campanha “Kony 2012” nos últimos dias tornou-se um fenómeno planetário. Todos aqueles que viram o vídeo da campanha certamente ficaram revoltados por Kony, "senhor da guerra", encontrar-se ainda em liberdade. Em 30 minutos a ONG, Invisible Children, expõem as atrocidades que Kony realizou no Uganda. Apelando ao sentimentalismo de cada um propõem uma missão, capturar Joseph Kony até ao final de 2012.
Apesar do imenso sucesso, logo surgiram variadas críticas relativamente às informações fornecidas no vídeo da campanha como também à acção da Invisible Children. Para além da campanha encontrar-se com cerca de 10 anos de atraso, uma vez que Kony deixou de ser prioridade, a ONG apela também à cooperação norte-americana com o Exército do Uganda continue, quando este é acusado de cometer abusos dos direitos humanos.



Assim penso que é fundamental expor sumariamente os últimos acontecimentos vividos naquele território.
Kony nasce em 1963 no norte do Uganda, no seio de uma família rural. Um ano antes, a 9 de Outubro de 1962 o Uganda havia tornado independente. Os primeiros anos da independência são marcados por várias lutas políticas, várias visões de Estado, golpes de Estado, ditadura, luta armada e assassinato de civis.
Entre 1981 e 1986 o Uganda deparou-se com uma guerra civil que opôs o governo de Milton Obote à guerrilha denominada National Resistance Army, liderado por Yoweri Museveni, visto que violações dos direitos humanos sucediam por parte das forças de segurança. Numa tentativa de parar com a rebelião uma parte do país foi destruída.
A 27 de Julho de 1985, a capital do Uganda, Kampala, é tomada por Tito Okello e é proclamado um governo militar. Milton Obote ruma ao exílio na Zâmbia, e o General Tito Okello inicia negociações com Museveni, com fim de cessar os conflitos entre tribos e organizar eleições livres e justas. Ainda assim o abuso dos direitos humanos continuava nomeadamente contra os membros do NRA e seus apoiantes.
Em Janeiro de 1986, o NRA toma Kampala, obrigando Okello e as suas forças a refugiarem-se no Sudão.
Tal acção levaria a uma revolta por parte da etnia Acholi contra Museveni. Na altura Alice Auma liderou um grupo de rebeldes em ataque contra Museveni, mas sairia totalmente fracassada, e Auma iria refugiar-se no Quénia, decorria o ano 1987. Com a ausência de Lakwena, Kony assume o que resta do grupo Holy Spirit Movement, que seria a semente para o que mais tarde se tornaria Lord´s Resistance Army (LRA). Joseph Kony tornar-se-ia figura relevante no confronto regional no norte do Uganda. Pretendia derrubar o governo de Museveni e implementar um governo baseado nos 10 Mandamentos da Bíblia. Impera referir que Kony se proclamava um profeta.
A organização que liderava seria apoiado por pessoas do norte do Uganda, mas com o passar do tempo diminuiriam os recursos, que resultaria na vitimização da etnia Acholi.
Nos anos seguintes, Kony e a sua organização LRA, cometeriam atrocidades à população ugandesa. Para além de saquear aldeias, matou milhares de pessoas, abusou e mutilou civis, raptou milhares de crianças.
As acções do LRA, na década de 90 permitiram desestabilizar as regiões vizinhas, nomeadamente o sul do Sudão, a República Democrática do Congo e a República Centro-Africana. Tal deveu-se em grande medida à elevada quantidade de membros que detinha o LRA, cerca de 10 mil.
Decorria o ano de 1994 e ao LRA conseguia o apoio do Sudão. O governo sudanês pretendia utilizar a organização na sua luta contra o governo do Uganda, uma vez que aquele tinha apoiado os rebeldes no Sudão.
É apenas em 2005, que o Tribunal Penal Internacional emite um mandado de prisão para Joseph Kony. Acusado de crimes contra os direitos humanos, alegou sempre inocência e no final do mesmo ano acabaria por fugir do Uganda. Um ano depois, 2006, Kony reaparece em Maio, para negociar a paz com o governo do Uganda e um cessar-fogo é declarado em Agosto. Dois anos depois, o acordo havia surgido entre ambos os intervenientes, mas aquando da assinatura do acordo de paz, Kony encontrava-se em parte incerta.

Actualmente o Uganda não se encontra em guerra, mas existe muito a construir num país que sofreu conflitos internos desde a sua independência. Joseph Kony deixou de se tornar prioridade para o governo ugandês, uma vez que já não se encontra no território.
A prioridade é reconstruir e melhorar a vida da população, especialmente das crianças, nos vários âmbitos, seja educação, saúde, saneamento básico, ou seja naquilo que é essencial a uma vida digna.
Ainda assim, penso que é fundamental que indivíduos como Joseph Kony sejam julgados pelas atrocidades que cometeram. É importante não esquecer as vítimas e capturar indivíduos como Kony, pode não ser prioridade mas tem que existir. Mais cedo ou mais tarde têm que responder perante a lei, ora vejamos como exemplo o recente julgamento de outro “senhor da guerra”, Lubanga.

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