Nestes últimos dias de forma um tanto discreta, têm surgido notícias sobre uma antiga problemática, o Irão e o armamento nuclear.
Não é difícil compreender o porquê de tanta polémica, sendo o Irão, um dos Estados do “eixo do mal”. A designação surge a 29 de Janeiro de 2002, pelo então presidente dos EUA, George W. Bush, para designar na altura três países (Coreia do Norte, Irão e Iraque), que constituíam uma grave ameaça ao mundo e ainda à segurança do seu país. Mais tarde juntar-se-ia Cuba, Líbia e Síria.
O Irão passava a fazer parte dos “outros”, nas RI. Como refere Adelino Maltez (2002: 78) «grande parte das concepções do mundo e da vida tem-se desenvolvido a partir de um processo de identificação política assente na distinção entre nós e os outros (…)».
Desde o (re) lançamento do programa nuclear do Irão, a tensão tornou-se patente para com grande parte do Ocidente. Importa reter que o programa nuclear iraniano foi lançado na década de 50 do século XX, com auxílio norte-americano. Após a Revolução Islâmica em 1979, o governo abandonaria temporariamente o programa, voltando àquele na década de 90.
Teerão alegaria que o objectivo do programa seria desenvolver centrais nucleares com intuito de gerar 6 mil MW de electricidade, enquanto que os EUA afirmavam que aquele seria uma cobertura para tentar obter armas nucleares. Apesar das acusações o Irão negaria toda e qualquer denúncia insistindo que exerceria o seu direito a tecnologia nuclear para fins totalmente pacíficos. Assistimos a um aumento da tensão entre aquele Estado e o Ocidente, e ao surgimento de sanções, já no primeiro decénio do século XXI, por parte da ONU, EUA e UE.
Em finais de 2009, o Irão pedia assistência à Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), com intuito de conseguir combustível para o reactor de pesquisa destinado a usos médicos. As negociações mediadas pelo Brasil e Turquia, fracassariam, pois a AIEA e o grupo dos 5 + 1, cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (EUA, Reino Unido, França, Rússia e China) e Alemanha, condicionaram e suspenderam as actividades de enriquecimento de urânio. Apesar de tal, o Irão em Fevereiro de 2010 começaria a produzir urânio enriquecido a 20%. A 11 do mesmo mês, nas comemorações do 31º aniversário da Revolução Islâmica, Mahmoud Ahmadinejad afirmaria que o Irão não só teria capacidade de produzir urânio enriquecido a 20% como a mais de 80%. A 80%, considerado weapons-grade, é possível fabricar armas nucleares.
A 6 de Abril de 2010, o então presidente dos EUA, Barack Obama excluía o Irão e a Coreia do Norte da nova doutrina nuclear norte-americana. Esta pressupõe o compromisso americano de não utilizar armas nucleares contras os países que não possuem este género de armamento e que respeitem as regras do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares. Obviamente Teerão entendeu esta exclusão como uma ameaça.
Mais sanções seriam adoptadas em finais de 2010, atingindo o sector energético (petróleo e gás).
Recentemente a AIEA alertava para progressos do programa nuclear iraniano. «O Irão já terá desenvolvido todas etapas essenciais para construir ogivas nucleares e mísseis, com a ajuda de cientistas estrangeiros». O governo iraniano referia que tudo não passava de “propaganda ocidental” contrapondo às ameaças de ataque militar israelita e ainda do Reino Unido. «(…) Na opinião de uma especialista israelita, “mesmo que o ataque militar tivesse sucesso, o melhor que iria fazer seria adiar a resolução do problema. E as consequências de qualquer intervenção militar seriam bem piores”». Para além do estado israelita, outros têm vindo nas várias declarações demonstrar o descontentamento e preocupação dada a sensível conjuntura. No passado domingo (13/10) Barack Obama referia que «o mundo está unido e o Irão está isolado». Apesar desta simbiose do Ocidente contra o Irão, Rússia e China (Estados que detém poder de veto no Conselho de Segurança da ONU) são totalmente contra novas sanções contra o Estado iraniano ou até mesmo uma acção militar.
Perante o cenário de ameaças contra o Irão, e como forma de retaliação afirmava que caso sofresse alguma acção militar não ficaria impávido e sereno e responderia da mesma forma não apenas no Médio Oriente.
Após o exposto impera várias questões. Não foram os EUA que iniciaram e apoiaram o programa de armamento nuclear no país? Não estará o Ocidente contra o programa nuclear iraniano, pelo simples facto do Irão actualmente estar identificado como um dos Estados do “eixo do mal”? O cenário seria outro caso o Irão estivesse a postura pró-americana que detinha antes da Revolução Islâmica em 1979? Porque não assistimos à mesma postura do Ocidente face à Coreia do Norte, visto que detém armas nucleares, ou então à Síria, que é acusada de possuir programa clandestino?
Estou convicta que se o Irão de hoje fosse o de há 50 anos atrás, o mesmo do tempo do Shah, não assistíamos a esta tensão, porque o governo iraniano estaria do lado dos “amigos”. Seria porventura uma mais valia para o Ocidente deter um aliado naquela zona geográfica, perto de grandes focos de tensão Médio Oriente. Efectivamente a realidade é outra.
Não assistimos às mesmas acções contra a Coreia do Norte (país do “eixo do mal”), provavelmente porque desde 2006 assistimos a testes nucleares condenados pela comunidade internacional, e também porque a sua superioridade nuclear face ao Irão. Relativamente à Síria, apesar da descoberta, pela AIEA, de um possível programa nuclear clandestino, com auxílio norte-coreano, nenhuma sanção foi até agora aplicada, presumivelmente dadas as circunstâncias que o país se encontra no momento.
«Na óptica de Teerão, o Ocidente representa uma ameaça existencial precisamente pela sua capacidade de derrubar a República Islâmica. Porque teme o poderio do Ocidente, o Irão delineou uma política externa e de defesa que visa fazer face a uma ameaça existencial, ou seja, será a capacidade nuclear que proporcionará ao país alguma medida de segurança». O Ocidente em contrapartida teme um clima generalizado de insegurança regional ou ainda a crescente influência iraniana na região ou até mesmo além desta, até porque segundo o State Department Country Reports on Terrorism e o Patterns of Global Terrorism caracterizam o Irão como o “mais activo país patrocinador” de terrorismo.
Impera encontrar soluções. De todas provavelmente a acção militar terá consequências devastadoras para todo o mundo, como tal penso que o bom senso irá predominar, e que verifique-se abertura para possíveis negociações. Não acredito que as declarações apocalípticas de Hugo Chavéz, «”neste momento, existe uma ameaça nuclear” que “poderá ser o fim do mundo”», poderão corresponder à realidade, até porque por mais radicalismos que possamos assistir não é uma tragédia que pretendem alcançar.
espero bem que não alcancem essa tragédia, mas os EUA têm que arranjar uma maneira de manter a sua maquina militar a funcionar, e parece que o Irão será o próximo. Os EUA estão sempre preparados para arranjar confusão fora das suas fronteiras. Só espero que o aviso do Chavéz se torne realidade, uma guerra nuclear agora podia alcançar dimensões grandes!!!
ResponderEliminarParabéns pelo blog, está muito bom :)